terça-feira, 25 de fevereiro de 2020

Diário de Mochila - 3° dia Mochilão rumo ao Paraguai


Diário de Mochila

Quinta-Feira, 24 de novembro de 2016 – 3° Dia (Primeira Parte)
(17:45h)
Hoje o dia foi definitivamente inesperado! Acordei cedo, tomei café e me despedi do casal que me acolheu em Torres/RS. Em torno dás 9h, caí na estrada em direção à ponte pênsil que marca a divisa do Rio Grande do Sul com Santa Catarina, sobre o Rio Mampituba. Tirei algumas fotos, e comecei a andar em direção a BR-101, onde Gerásio havia me dito que eu encontraria um posto de fiscalização da Polícia Rodoviária Estadual, e provavelmente conseguiria uma carona. Caminhei por uns 8km até chegar no respectivo local de fiscalização, e lá, me animei ao ver que todos os caminhões com carga que passavam da divisa, paravam para pesagem. Fiquei mais ou menos 30min abordando motoristas e tentando uma carona, mas só recebi negativas e desculpas, (provavelmente por prudência dos mesmos), então, decidi seguir caminhando pela BR até encontrar um posto de gasolina onde pudesse ter melhor sorte. Depois de alguns quilômetros percorridos sob sol forte e sentindo demais o peso da mochila nas costas, fiquei sem água, e não via nem sinais de civilização. Nesse momento, parou um carro alguns metros a minha frente e o motorista me perguntou se eu precisava de uma carona. Graças a Deus! Haha



Nilton Nogueira era o motorista, morador de Praia Grande/SC, estava voltando de Torres onde havia ido surfar pela manhã. Ele trabalhava como guia nos cânions gaúchos e em trilhas daquela região, e me levou até um posto de combustível que ficava ao lado de um grande atacado na beira da rodovia. 

Que vibe incrível desse cara, que já havia visitado diversos países e também viajava como mochileiro. A estrada tem dessas, acaba colocando as pessoas certas no nosso caminho, exatamente na hora que mais precisamos!

(18h)

Em Praia Grande/SC, fui deixado em um posto de gasolina que ficava ao lado de um grande atacado. Em frente ao atacado, no estacionamento, avistei um rapaz que acabará de sair de lá de dentro, comendo um Snickers e se dirigindo ao seu carro. Abordei o mesmo, questionando se não ia em direção a Laguna, que era meu próximo destino, e o mesmo acenou positivamente com a cabeça, dizendo que ia até Criciúma/SC e poderia sem problemas me dar uma carona até lá. Ao entrar no carro e iniciar a viagem, descobri que o rapaz, com rosto de 20 anos, se tratava do competente médico Bruno Bristot, e que ele também gostava muito de viagens. Identifiquei-me muito com ele pela forma de pensar e achei a humildade em que ele me questionava sobre tudo e também falava da vida dele incrível!

Bruno me levou até um posto na entrada da cidade de Criciúma, e logo ao descer do carro, já consegui uma nova carona com um caminhoneiro que acabará de almoçar. O motorista era gaúcho, da cidade de Canoas/RS e estava levando uma carga para o norte de SC. Seu nome era Daniel De Souza, e foi uma companhia muito agradável durante o trajeto até Laguna/SC. Deu-me muitas dicas sobre como abordar os motoristas para conseguir mais facilmente uma carona, como a dica de se manter sempre apresentável e com uma roupa (na medida do possível limpa), para parecer com o estudante que eu dizia ser. Haha

Daniel me contou sobre seu trabalho, estrada, família e sobre o tempo que havia trabalhado na Petrobrás em SC. Muito gentil, me deixou na entrada da cidade de Laguna, pelas 14h, onde começaram os verdadeiros “perrengues” da viagem...


(21:30h)
Da entrada da cidade de Laguna/SC até o centro da cidade, há uma distância considerável, distância que percorri de ônibus intermunicipal, pagando R$2,90 a passagem até a rodoviária. Ao descer do ônibus, peguei a informação com um taxista de que o camping mais próximo ficava após o centro histórico da cidade, no alto do morro no qual também havia um mirante que se podia ver toda a cidade, chamado de Morro da Glória. 

O centro histórico da cidade é simplesmente incrível! Passei por diversos prédios centenários, pela igreja matriz de Santo Antônio que tinha mais de 300 anos e pela casa onde morou Anita Garibaldi, importante ícone da Revolução Farroupilha. Pegando informações com algumas pessoas, cheguei à estrada que levava ao mirante, no alto do morro. Fiz uma subida extenuante, até as portas do camping indicado, que pra minha surpresa, estava fechado e só abriria durante o mês de dezembro..


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Segui o caminho até o mirante, já que estava ali, mesmo que sem uma gota de água e encharcado de suor, e valeu muito a pena. Mesmo com a visão um pouco encoberta pela vegetação, do mirante se consegue ver grande parte da orla e cidade de laguna, e fiquei completamente apaixonado por aquela vista! No mirante também tem uma imagem de nossa senhora gigantesca e de braços abertos, onde havia algumas pessoas fazendo orações e tirando fotos. Lá de cima, dava pra ver a barra de Laguna, onde eu sabia haver outro camping próximo, pois já havia pesquisado na internet antecipadamente. 
Decidi descer novamente e seguir naquela direção até encontrar o respectivo camping.



A cada passo que eu dava, descendo a ladeira que me levaria a um bairro cheio de comércios e prédios, (que depois descobri ser o verdadeiro “centro” da cidade, chamado Praia do Mar Grosso, visto que a maioria dos comércios se localizava ali), a mochila com seus quase 20km comprimia e machucava meus ombros, enquanto a sede me torturava pelo sol escaldante de fim de novembro. Andei em torno de 1h e 30min, com passos marcados e lentos até chegar as portas do camping Molhes da Barra, e dar de cara com a placa de aviso: “abriremos somente em dezembro, na semana do evento Moto Laguna”...

Eram passadas as 18:30h da tarde, estava com fome, sede, cansado e não tinha onde passar a noite. Decidi andar em direção a praia, mesmo que quase não pudesse mais agüentar o peso da mochila e a dor na planta dos pés. Na praia, tirei a mochila, as botas de caminhada e meias, e fui molhar os pés na água gelada do mar, ainda sem saber o que fazer. A praia estava quase deserta, mas a insegurança em acampar sem proteção sem nunca ter feito isso antes me deixava receoso. Sentei ao lado da mochila, e fiquei alguns minutos vendo o mar, até que o improvável aconteceu...

Um cachorro pequeno, parecendo da raça York Shire correu na minha direção e pulou no meu colo, me dando um baita susto! Nessa hora, uma menina veio correndo para buscar ele e me pediu desculpas. Não perguntei o nome dela, apenas sorri, tamanho era o meu cansaço. Ela sentou próxima de onde eu estava, e se juntaram a ela outra menina, mais nova e um rapaz com dreads no cabelo. 

Nessa aproximação, vi uma oportunidade de conseguir algum lugar para ficar, ou ao menos alguma dica que pudesse me ajudar. Me dirigi a eles indagando se sabiam de outro camping que estivesse aberto naquele dia na cidade. Para minha surpresa, me indicaram um lugar chamado “Barulho do Mar”, que ficava muito próximo dali e que para chegar até lá eu precisaria atravessar um canal de acesso ao mar com um barco que fazia a tal travessia de pedestres. Agradeci, coloquei a mochila nas costas, já próximo de escurecer e parti rumo ao barco para mais uma expediência única! Atravessei o canal pagando o valor de “passagem” de R$1,50, e já do outro lado, segui em busca do tal Camping Barulho do Mar, citado anteriormente. Andei poucos metros e cheguei ao camping que também funcionava como restaurante, sendo atendido por uma das filhas do dono, a jovem Helena. A moça me indicou o local onde eu poderia montar minha barraca, que pela primeira vez seria armada desde que eu a havia comprado. Logo Helena e sua irmã mais nova, Laura, sentaram-se num banco próximo a mim, visto que eu era a atração no momento, por ser o único campista naquele dia em função da data fora de época, e começaram a rir de mim, pois eu não fazia a menor ideia de como montar aquela barraca! Kkk



Laura prontamente veio me ajudar e me ensinou passo a passo o sistema de montagem das varetas e lonas, assim como me deu a dica do melhor lugar para montar o acampamento em função do forte vento que poderia soprar do mar a noite. Fiz amizade com os três filhos dos donos do camping, Helena, a mais velha, tem 17 anos e cursa Direito em uma faculdade da cidade de Tubarão/RS. Laura tem 14 anos e é muito esperta e alto astral. João é o mais tímido dos três, tem cabelo cumprido e uma baita marra de surfista. Gostei muito deles e logo contei sobre a trip e minha trajetória para chegar até ali.



Muito cansado, após um merecido banho, cozinhei o melhor macarrão instantâneo da minha vida, comi e fui deitar. Minha fome era tremenda, visto que eu só havia tomado café da manhã neste dia, e ainda, caminhado mais de 20km no sol escaldante até chegar neste momento.
No final deste dia longo e louco, chego à conclusão de que as coisas que realmente importam o dinheiro não pode comprar. O esforço, dedicação e otimismo podem me levar onde eu quiser chegar! Deitado dentro da barraca, ouvindo o barulho do mar e o vento em harmonia lá fora, tenho a sensação de que ficaria a vida toda aqui. E pensar que demorei tento tempo para partir, para me permitir essa experiência de autoconhecimento. Agora entendo que a beleza dos lugares não está nos cartões postais, mas sim, nas pessoas que encontramos no caminho.
Felicidade não se encontra no destino, mas na viagem...